terça-feira, 6 de março de 2012

HISTÓRIAS QUE A BOLA NÃO CONTA

"Eu não vi Kennedy morrer
Eu não conheci Martin Luther King
Eu não tenho muito para dizer...
Nasci em 72, nasci em 72"

Adaptação da canção Nasci em 62 da banda paulistana Ira!



Nasci em uma quarta-feira de uma semana santa. Início do outono em Porto Alegre, no Hospital Ernesto Dorneles, exatamente às 15 horas de um dia chuvoso. Deve ser por isso que eu gosto tanto de dias cinzentos; deve ser por isso que o Outono é a estação do ano que eu mais gosto. As folhas caindo no chão, o clima nem quente nem frio, as árvores secas... bem, para falar a verdade não sei se era um dia chuvoso o dia 29 de março de 1972. Só escrevi assim porque achei que ficaria mais poético.

"... Veja você, quem diria que ironia,
Desconbri que sou feliz...

Sonhei com meu pai e ele soria,
Chimarrão pra acordar, era só o que eu queria..."

Versos da canção Outono em Porto Alegre, da banda gaúcha Engenheiros do Hawaii.



Em 1972 passava na tv, provavelmente preto e branca em praticamente todos os lares desse país, uma novela, da qual eu não sei o nome, poderia até perguntar para minha mãe, mas sempre esqueço de o fazer; o que importa é que nessa novela havia um casal de protagonistas. E a D. Sirley na 4ª gestação, esperando e desejando uma guria, a tão sonhada guria. O casal da novela era formado pelo Márcio e pela Thais. Coincidentemente (se alguém acredita no destino...) havia uma amiga da minha mãe que também estava grávida. E desejava ter um guri. Seria o Márcio e a Thais seria a filha da Sirley. Assim ficou combinado, mas esqueceram de combinar com Deus. E esse esquecimento custou à Sirley 'perder' a Thais e ganhar o Márcio e a sua amiga ganhar a Thais. Assim foi escolhido o meu nome, meio que ao acaso com a surpresa de ter nascido um guri ao invés da guria que a Sirley ainda tentou mais uma vez, sem sucesso. E alguém aqui acredita nas linhas que o destino escreve? Bem, eu gostaria de conhecer a Thais, mas acho que a vida não será tão genorosa assim...

Lembro da minha avó, na verdade bisavó materna, a italiana que nos levava na missa desde pequeninhos. Não conheci minha avó paterna e materna e nem meu avô paterno, o velho Laudelino. Mas conheci a bisa e seu filho, meu avô, embora só tenha sabido muito tempo atrás que era meu avô. Uma história e tanto, que fica para um outro dia. Quem sabe um livro ou um roteiro de filme? Já pensei muito sobre isso.


O fato é que eu era vidrado nessa (bis) avó. Lembro de todas as noites, quando era viva, durante a madrugada, andar pela casa, atravessá-la, para chegar ao seu quarto e me deitar aos seus pés, porque na cabeceira estava o meu irmão mais velho Rogério, que dormia sempre com ela. E assim ela me apelidou de Coruja. Tenho algumas lembranças de minha (bis) avó. Mas não recordo do seu rosto. Morreu em 1976, último ano de um jejum de 8 anos do GRÊMIO sem ganhar um Gauchão (o fez em 77, com o famoso gol de André Catimba e seu salto mortal que deu errado - time comandado pelo saudoso Telê Santana). Lembro do dia do enterro dela, o Rogério com 10 anos, aquela movimentação de velório, mas da qual nem eu e nem os demais irmãos participaram. Eles nos excluiram por sermos muito pequenos e não pude me despedir daquela velha senhora que tanto eu amava, sem nem saber direito o que era o amor. Eu tinha 4 anos. Acho que essas 'escapadinhas' durante a madrugada demonstravam o meu espírito transgressor, a minha inquietude com as leis e regras... tenho vivo na memória esses dias (noites/ madrugadas) que atravessava a sala, a sala de jantar, a cozinha, para chegar no quarto da vó. E como era tão pequeninho, parecia que cruzava o mundo... o real para o imaginário.

Depois que ela morreu, seu quarto virou o quarto da fantasia (o que para eu já era em sua vida), o quarto que podíamos brincar e bagunçar. Foi intitulado o "quarto da bagunça". Tenho uma lembrança estranha, que deve ter se misturado com fantasia: dias depois de sua morte ela subindo a escada que dava para o porão, de branco, como uma nuvem... e me falando para eu aproveitar ao máximo a vida, porque morreria com 45 anos. E trago isso comigo pela vida toda.

O que é realidade e fantasia na vida de um guri de 4 anos? E num guri de 40 anos?


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