sábado, 26 de julho de 2014

CRÔNICA DE UM AMOR LOUCO

O local:

meu quarto.

A hora:

Nove horas da manhã. Não se ouve barulho lá fora. Sábado de manhã sempre há silêncio maior. Houve um tempo que acordávamos com o canto dos pássaros. Depois que a elite descobriu a Gleba e a região virou o metro quadrado mais caro da cidade, o sossego se foi com a chegada dos arranha-céus nem tão arranha-céus assim, apesar que aqui do lado tem um prédio de uns 25 andares. Alto demais para os padrões de Londrina. Logo, logo o que antes era valorizado, será desvalorizado com a superpopulação. Ou não.

Adeus canto dos passarinhos! Adeus silêncio, adeus tranqüilidade!

A cena:

Eu deitado, do lado direito da cama, deitado de lado, lendo Bukowski no computador, Crônica de Um Amor Louco; a Juliana, do lado esquerdo da cama, deitada de lado, assistindo àquele carinha que faz a Dilma no programa do Rafinha Bastos, e dando risadas.

Acabamos de acordar.

Por que escrever sobre isso?

Por que não?

Depois de uma noite tórrida de sexo as pessoas costumam acordar de melhor humor. Principalmente se for manhã de sábado. Hot sex. É tudo o que todos querem. Sexo quente e selvagem.

“Todo mundo quer amor,
Quem tem pinto, saco, boca, bunda, cu, buceta,
Quer amor de verdade.”  

Algumas pessoas quando terminam de fazer sexo acendem o cigarro e viram de lado, depois de algum comentário que passou pela cabeça durante o ato. Mesmo concentrado, sempre passa algo nada a ver pela cabeça. Por melhor que o sexo é, às vezes o pensamento voa. E depois de fumar um cigarro, vira de lado e volta aos seus pensamentos... pensamentos absortos; absorto em pensamentos. Já escrevi música sobre isso...

Nós não fumamos. Viramos de lado e cada um liga o seu notebook e mergulha na vida virtual. Ou complementa a vida real com alguma diversão online. Costas com costas, bunda com bunda.

“Preciso colocar uma TV no quarto para continuarmos em sintonia depois do sexo” – penso.

Assisto a mais um episódio de Friends. Estou viciado nos Friends. Penso em ler alguma coisa interessante.  Procuro Bukowski. Crônica de Um Amor Louco. Devoro as páginas baixadas da internet. Ler no PC é ruim, não é das melhores experiências; deitado de lado, a cabeça dá um nó, porque as letras estão em pé e tua cabeça de lado. Deve fazer mal para os olhos, algum oftalmo reprovaria. Mas para quem leu a vida inteira andando pelas ruas (e nunca cai em nenhum buraco ou tropecei, ou fui atropelado. Acho até que andando sem ler corro mais perigo de tropeçar), logo me adapto. Não é a primeira e nem será a última vez que vou ler livro baixado da internet.

A internet é legal. Se não fosse ela, teria que esperar até o dia seguinte para ler o livro, isso se achasse em alguma livraria ou sebo. Nos anos 1980 certamente ficaria entediado sem ter o que fazer, assistir ou ler.

Escuto Maybees. Blue Butterflies. Grande canção. Magnífica canção. O que é o paraíso? Um bom sexo, uma boa canção, um bom livro... tudo o que uma madrugada de sexta feira (de sábado, para ser mais exato) pode proporcionar. O que só uma madrugada de sexta para sábado pode proporcionar. Na play list rola Cure:

“I don't care if Monday's blue
Tuesday's gray and Wednesday too
Thursday, I don't care about you
It's Friday, I'm in love…”

No quarto ao lado o Victor sonha com seus sonhos de vida. Sonho de alguém que curte Mutantes, que acha Mutantes a melhor banda de rock do Brasil, não deve ser um sonho muito normal. Sonho nunca é normal!

Não que Mutantes não seja a melhor banda de rock do Brasil de todos os tempos. Mas quem curte Mutantes geralmente não é normal. E em sonhos, menos ainda.

Não sei se Mutantes é a melhor banda de rock brasileiro de todos os tempos. Achava que DeFalla, nos primeiros discos, antes do EduK despirocar, aliás, quando o EduK era o mais despirocado do caralho, a melhor banda de rock. Depois veio Os Cascavelletes e o não menos maluco Flávio Basso, hoje intitulado Júpiter Maçã. Barão Vermelho também está no mesmo nível. Ainda gosto mais da curta carreira dos Cascavelletes. Mas todos são afudê! E beberam muito na fonte dos Mutantes, Beatles e Rolling Stones. E tem o Ira!

No quarto da frente o Gui, louco por Pink Floyd. Sempre curti mais Doors do que Pink Floyd. Mas por influência dele tenho escutado mais Pink Floyd ultimamente. E o Gui dorme o sono dos inocentes.

Depois do show dos Mutantes eles dormirão até tarde. Com certeza. Experiência única. Não a de dormir até mais tarde, mas a de assistir a um show do Mutantes.


E a vida se passa em segundos, o passado, o presente e o futuro. Passado e futuro próximos. Como num sonho, as imagens se condensam e se misturam na cabeça. 

E nada parece ser o que é.

domingo, 13 de julho de 2014

HISTÓRIA DE COPAS


A primeira copa do mundo que minha memória me leva é a de 1978. Não que me lembre de alguma coisa, que vivi, pois toda minha lembrança dessa copa se refere ao que eu já li posteriormente. Mas de ter vivido, lembro do álbum de figurinhas e de copiar as letras, sem saber ler, da capa do álbum.

Em 1978 minha avó já tinha morrido e eu ainda morava em Porto Alegre. Fui expelido do paraíso pouco tempo depois, quando fomos morar alguns milhares de quilômetros longe, em Santos, no litoral sul paulista.

Sempre penso em como seria minha vida se tivesse ficado em Porto Alegre. Queria ter outra vida para fazer tudo diferente, só para ver no que daria. Acredito que todos os caminhos me trariam para onde estou hoje, mas seria interessante viver essa experiência. Por isso que sou fascinado por filmes que falam sobre volta ao passado, máquina do tempo e coisas semelhantes. Como saudosista, gostaria muito não só de voltar no tempo em alguns momentos da minha vida, mas também em épocas que não vivi, como no filme Meia Noite em Paris, de Woody Allen.

Mas voltando às copas, foi em 1982 que acompanhei realmente uma copa do mundo. Aquele time que fazia qualquer amante do futebol brilhar os olhos. Como a de 1970, tri campeão no México, aquela de 82 nunca mais existirá. Muitos dizem que o futebol ‘enfeiou’ porque aquele escrete canarinho, que jogava o “fino da bola” ficou mais conhecida por ser uma seleção perdedora. Telê Santana, o técnico daquela seleção, só perdeu a fama de pé frio quando conseguiu vencer a Libertadores e o Mundial Interclubes com o São Paulo.

Nessa época, logo após a derrota do Brasil para a Itália de Paolo Rossi, saímos arrasados para a rua e, claro, fomos jogar bola. E todos queriam ser Paolo Rossi e repetir a comemoração de um dos gols, caído e seus companheiros fazendo montinho nele.

Foi minha maior decepção com uma seleção brasileira. Mesmo tendo saído do Brasil desacreditada, a seleção canarinho chegou na Espanha encantando a todos, jogando um futebol de campeão, o que lhe deu todo o favoritismo. A Itália, que quase não se classificava, na primeira fase foi medíocre, entrou na segunda fase como azarão e ganhou de Brasil e Argentina, que faziam parte do grupo. E depois ganhou o título da Alemanha.

Em 1986, ainda com Telê, mas sem o mesmo brilho, vi uma seleção com Zico se recuperando perder um pênalti contra a França, num jogo duríssimo que acabou empatado em 1 a 1 e o Brasil derrotado nos pênaltis, com Sócrates perdendo um e o azarado goleiro Carlos mandar para o fundo das redes uma cobrança da França que batera na trave e nas costas do goleiro.  

Andávamos Santos inteira para trocar figurinhas. Comprávamos Ping Pong (o chiclete que trazia a figurinha embalada) em diversos locais diferentes para ver se vinham figurinhas diferentes das dos lugares que sempre comprávamos. E por onde andávamos tinha alguém com figurinha para trocar. Lembro que comprávamos caixas e caixas de chiclete e não chegávamos a mastigar, apenas para pegar as figurinhas. Era uma batalha para preencher o álbum. E, pelo que minha memória me diz, não tinha essa de ter jogador que não foi jogar a copa no álbum. Talvez tivesse menos frescura dos técnicos na hora de convocar seus comandados; talvez tivessem menos ânsia de ganhar dinheiro com produtos da copa; ou talvez ainda o futebol nem se interessasse muito para essas ‘pequenas’ paixões das crianças. Nem tudo era grana naqueles tempos.

Em 1990 o Brasil de Lazaroni perdeu nas oitavas para a Argentina de Caniggia e Maradona. O mesmo Maradona que não jogou a Copa de 1978 em casa por ser muito novo, que em 1982 arrebentou Batista na derrota para o Brasil por 3 a 1 e desfalcou contra a Itália e que em 1986 fez até gol de mão na campanha vitoriosa do bi no México. Foi uma seleção que não animou a ninguém.

Nessa copa comprei uma camisa da seleção, acho que a primeira vez que torci com uma camisa do Brasil, da Topper, no Jumbo Eletro da Amador Bueno, que estava em promoção. Essa camisa sobreviveu até a Copa de 1994, apesar de eu ter ganho uma da Umbro, que foi usada em 1994 e 1998.

Em 1994, já em Londrina e com o Victor com 1 ano, vimos em uma televisão minúscula, aquela que tinha rádio também, acho que de 5 polegadas, o Brasil vencer contra a Itália nos pênaltis e oferecer o tetra a Airton Senna que havia morrido alguns meses antes da Copa.

Em 1994 morreram em uma mórbida sequência, Senna, Denner, um promissor meio campista habilidoso revelado pela Portuguesa paulista, que ganhou seu único título profissional pelo Grêmio (Campeão Gaucho) e que tinha se transferido para o Vasco, mas com uma recém acertada transferência para o futebol europeu; dias depois ocorreu a morte de Kurt Cobain. Até a copa do mundo só se falava de Senna, uma pontinha de Denner e um pouco de Kurt Cobain. Foi meu ano mais negro, com certeza, apesar do tetra.

O Victor se mostrou um pé quente. Até porque em 1994 fomos campeões da Copa do Brasil, em 1995 fomos campeões da Libertadores e em 1996 Bi Campeões Brasileiros, um time de 11 guerreiros montado por um certo técnico que começava a despontar no cenário nacional, chamado Felipão.

Em 1998 o Gui nasceu. No meio da copa da França. Lembro de fazer alguns escândalos na madrugada de Londrina e de ter reclamação em casa pela gritaria. Mas o Gui nem se mexia, dormia com sono profundo e tranqüilo. E o Brasil sucumbiu diante da França por 3 a 0, na “Copa vendida”, quando Ronaldo, esse mesmo ‘comentarista’ de uma certa rede de TV, teve um piripaque e quase não joga a final.

Na copa de 1998 a Juliana ganhou uma camisa de treino do Brasil na tampinha da guaraná Antarctica, patrocinadora da seleção. Nesse fui a Porto Alegre e voltando por São Paulo, em Cumbica, no ônibus que nos levava do avião para a sala de embarque, para fazermos a escala no vôo para Londrina, um guri me pergunta se eu era jogador da seleção, por estar com a camisa de treino. Deu vontade de falar que sim, que eu era o Cafu, mas não fiz essa sacanagem, dei risada e disse que não.

O Gui foi para casa, da maternidade do Evangélico exatamente no dia que o Brasil disputava a semifinal contra a Holanda e que ganhou nos pênaltis defendidos pelo Taffarel, o especialista em nesse tipo de cobranças.

Aí veio 2002 e o Penta no Japão/ Coréia. Foi nessa copa que o Ronaldinho Gaucho fez um gol de falta sem querer na Inglaterra e Brasil ganhou dos britânicos de 2 a 1. Nessa Copa também recebi algumas reclamações de bagunça em casa por conta dos jogos e das minhas comemorações escandalosas. Mas dava de ombros e continuava a torcer com muito afinco e algum exagero.

O Gui parecia não se interessar por futebol e meu companheiro de jogos era o Victor. O Gui ficava em algum canto de casa brincando de carrinho ou descia para brincar com os amigos, sempre sob a supervisão da Juliana, pois era pequeno. Acredito que somente em 2006 que ele começou a se interessar e a assistir mais futebol.

Não me recordo muita coisa da Copa de 2006. Morávamos em Rolândia e estávamos quase que de mudança para Caiobá, no litoral paranaense. Eu trabalhava em Londrina e a Juliana na Dori, em Rolândia, o que nos motivou a mudar de cidade. Fazíamos churrasco a cada vitória do Brasil. O Patrick já estava conosco. Torcia com uma camisa do Grêmio que pertencera ao Victor, se não me engano uma das primeiras da vida dele. Nessa copa acho que o Brasil perdeu nas quartas para a França, no episódio da meia do Roberto Carlos.


Em 2010, na África do Sul, já estávamos morando aqui na Jerusalém. Fomos eliminados novamente nas quartas, desta feita pela Holanda. E se o culpado na anterior era o Roberto Carlos, o eleito em 2010 era Julio Cesar e o técnico Dunga, este o herói do tetra, ainda como jogador.

Em 2010 não colecionamos mais figurinhas das seleções. O mundo mudou muito desde as figurinhas que vinham no chiclete ping pong dos anos 1980. O futebol também. Mas as histórias permanecem lá, de alguma forma vivas em nossa memória. Contando com a de 1978, são 10 Copas nos meus 42 anos de vida, em 4 cidades diferentes: Porto Alegre, Santos, Londrina e Rolândia. E a próxima onde estaremos?
É sempre muito divertido esse período de Copa. Pena que passa rápido. Então, até 2018 na Rússia, com mais futebol, torcida e histórias. Fica o gostinho de quero mais e muita, muita saudade.