sábado, 31 de março de 2012

ROCK AND ROLL, BABY, ROCK AND ROLL, PLEASE!


Ler Mate-me Por Favor é como ler um pouco da minha história, ao menos no que diz respeito à parte do rock and roll, a parte em que a gurizada se reunia para fazer um som pesado e com todos as suas limitações de grana, instrumentos decentes e até mesmo de não saberem tocar direito. Mas o início do Punk era de muita loucura. O final dos anos 60 estavam fervilhando o lance de liberdade, de ser diferente, de novidades, de ser diferente. No fundo, os caras só queriam algo mais simples na música, que estava virando mastubação mental com os loucos solos das bandas pré punks e com o progressivo. Para quem não sabe, escute um pouco de Pink Floyd, por exemplo, solos e mais solos, instrumentos experimentais, músicas longas e massantes, muito ácido e loucura. Então sugem uns guris de Nova York, principalmente, querendo ser diferentes, ter uma atitude cool. E isso significava usar drogas diferentes do ácido, fazer música diferente do que havia no momento e se vestir de forma cool, ou seja, ser diferente e ser descolado. As drogas foram importantes, pois o som que eles estavam tocando exigia a utilização de drogas pesadas, como cocaína e principalmente a heroína. Os picos eram constantes e muitos dos nossos (ao menos meus) ídolos se drogaram por vinte e tantos anos. Tanto que Johnny Thunder, quando morreu em 1991, não tinha mais onde se picar, sendo que já tinha utilizado até veias dos pés.

Nessa passagem do texto, lembro de que quando o filme do Cazuza passou muitos puritanos exclamaram o que seria a ignorância da juventude em cultuar ídolos que não passavam de marginais drogados e que viviam em excesso, sempre chapados. Tipo: que exemplo é esse para nossa juventude. Essa é a percepção de quem não tem a sensibilidade de perceber que a contracultura, a rebeldia, a genialidade, têm um preço alto. Ser contra a mesmice que nos cerca não é fácil, remar contra a maré e lutar contra a moralidade imbecil, castradora, emburrecedora, custa caro, assim como custou caro a esses ídolos, muitas vezes a sua própria vida. Muitos deles morreram jovens

"É tão estranho, os bons morrem jovens
Assim parece ser quando me lembro de você
Que acabou indo embora cedo demais"

e nos deixaram incompletos, assim como suas obras. Viver mil anos em um, não é para qualquer. Só para pessoas excepcionais, para gênios, que nos deixam cedo demais, mas que deixam um legado imortal.

Estranho que na passagem da morte de Johnny Thunders, um dos maiores expoentes do punk rock, da clássica banda The New York Dolls, estivesse tocando a canção Don't Go, do Ramones. E, embora Dee Dee Ramone fosse desafeto de Johnny (e vice versa) e do episódio em Paris do roubo da jaqueta do primeiro e ter sido encontrada na mala do segundo, que a trocaria por heroína, poderia bem ter sido feita para Johnny, o que, é claro, não foi feita. Seria apenas mais uma daquelas coincidências da vida (estar escutando Don't Go na academia e lendo a passagem da morte de Johnny) se eu acreditasse em coincidências. Mas como eu sempre falo, tudo tem um porquê. São as complexidades dentro das complexidades, onde se descobre uma e outras se abrem para serem esclarecidas e cada vez mais aparecerem. Nunca terminam. Para os preguiçosos e que são facilmente influenciáveis, uma tortura.



Falando de complexidades, anos atrás, ainda na faculdade, assim me senti quando comecei a estudar Psicanálise e me sentia angustiado por saber que a cada conceito entendido, novos apareciam para serem esclarecidos e entendidos e aquilo nunca, nunca acabou. Um exercício eterno da busca do desconhecido, do esclarecimento do tudo e do nada.

Bem, mas escrevia eu sobre lembrar da minha formação musical e do punk rock. No final dos 80's o punk, ao menos quando participei do movimento, não era formado por jovens junkies como nos primórdios, mas sim por garotos sedentos por rock pesado e por parecem cools, para chamar a atenção das garotas. Só não tinham drogas, nem leves e nem pesadas. É que ficávamos chapados e loucos pelo próprio rock, era nossa droga; escutar um disco dos Pistols, do Clash, dos Dolls, dos Ramones nos abria a mente, como as drogas faziam e fizeram com nossos ídolos. Eles terem passado pelas drogas pesadas e terem vivido degradantemente nesse submundo nos propiciou e permitiu que vivêssemos os mesmos sentimentos de revolta, de liberdade, a mesma atitude cool, sem que mergulhássemos de cabeça nas drugs. Lembro de quando saíamos de um transe psíquico que a audição do Never Mind The Bolocks nos propiciava e queríamos fazer aquilo, pegar nossas guitarras, rasgar nossas roupas, usar coturnos e ser iguais a eles, mas sem a necessidade de se chapar com cocaína. Simplesmente porque já estávamos chapados; de sair de uma sessão de Sid & Nancy ou Rock and Roll High School e querer ter um romance destrutivo como dos primeiros ou participar de uma festa rockandroll ocmo no segundo filme.

O Zé Renato dizia que não usava drogas porque não tinha interesse, mas que se achasse cool ele usaria, sem se importar com porra nenhuma. Eu não usei drogas porque sei que me viciaria facilmente, sempre fui fraco para os prazeres da vida, sei que ao sentir um prazer tão grande eu dificilmente conseguiria não querer sentir aquele prazer novamente. Sou quase um hedonista... porém os caras com quem andávamos não usavam drogas, nem maconha rolava. No máximo umas biritas e o velho cigarro.

Entretanto, quando saí de Santos em 1991 e fui estudar em Assis, alguns daqueles caras com quem andava, já melancólicos e decadentes, aos 18 anos, começaram a usar drogas como alternativa para a chatice que a vida se mostrava àquelas alturas. Tanto que o Ronaldo chegou a se viciar em cocaína. E me descreveu os sintomas que a droga lhe proporcionava sob o efeito e na sua ausência. Aprendi muito com uma ligação que ele fez em 1998 mais ou menos, de Santos, que durou mais de duas horas de conversa.

O Zé Renato ainda andou mais uns anos com a galera punk, Fábio HC, Fernando, Barriguinha, os caras de Cubatão, Pipa e tantos outros, que me afastei quando fui estudar. Na minha memória guardo a história do Paul Cook, que ganhou essa maravilhosa alcunha por ser muito parecido com o baterista dos Pistols, que foi estudar História na USP de São Paulo e certo dia foi encontrado enforcado em seu quarto. Os demais devem estar vivos e talvez menos punks e engolidos pelo sistema. Sempre acreditei no punk como uma revolta da juventude, não autodestritiva como muitos querem passar, mas contra a merda toda instituída, uma forma de equilíbrio para poder sobreviver ao sistema opressor, manipulador. Depois vamos envelhecendo e amadurecendo e infelizmente aprendemos que não podemos lutar contra esse poder do sistema e então nosso ímpeto revolucionário se apaga. E esse ímpeto muitas vezes permanece em algum canto de nossas almas e viramos escritores, blogueiros, artistas, montamos bandas, ou simplesmente damos de ombros para todas as merdas que querem nos empurrar, para estravazarmos essa porra toda que se mantém adormecida em nossas almas. E por ser assim, somos incompreendidos, chamados de loucos ou imaturos. Mas apenas estamos vivendo da forma como queremos, fugindo da mesmice e tentando não sermos (tão) manipulados em nossos gostos, desejos e vontades. Sinto na pele por ser diferente e virar alvo de brincadeiras por tocar rock em churrascos ou colocar um cd dos Ramones na academia para me exercitar.

Mas também nos tornamos prisioneiros da nossa própria família, como diz a canção dos Titãs, caretas e preocupados com o perigo que circunda a adolescência dos nossos filhos, aqueles mesmos perigos que nos circundaram na nossa revolta. Por isso a Psicologia, a Psicanálise e principalmente o livro Laranja Mecânica me audaram tanto a entender que é apenas um mometo da vida, que, infelizmente, como tudo, passa muito rápido (mesmo porque se não fosse rápido não agunetaríamos). E, aos que como nós, sobreviveram à loucura adolescente, seguimos essa melancólica e decadente vida burguesa, como se mortos estivéssemos; então, como Dee Dee ao saber da morte de Johnny, meses antes da do Dead Boy Stiv Bators e recente de um amigo, desejou que a sua morte fosse a próxima, desejamos a nossa ainda jovens, para não virarmos velhos decadentes e nostálgicos. Como na canção do Who My Generation!


quarta-feira, 28 de março de 2012

AFRESCO

Quando falo dos 80's com tanta ânsia e fervor, defendendo essa década como se fora meu maior tesouro, talvez os parcos leitores pensem que sou saudosista ou algo semelhante, porém, foi uma década importante e sem dúvida mais produtiva do que as décadas seguintes, apesar do grunge, Nirvana, Smashing Pumpkins e etcs... entretanto, olha o que a década de ouro fez com uma música dos 60's, uma grande transformação que ficou muito melhor. Assistam o original:



Agora assistam a versão da banda de pop eletrônico (o que se convencionou nos 80's chamar de Technopop), que utilizou a base da música e criou uma belíssima canção, que virou clássico do estilo de música e da década.



E então, qual sua avaliação?



sábado, 24 de março de 2012

PUNK ROCK SONG DEFINITIVE


Lendo o livro "Mate-me Por Favor, a História Sem Censura do Punk" fiquei pensando na canção punk definitiva. I Wanna Be Your Dog de Iggy Pop e os Stooges é uma séria candidata. O baixo pesado, uma porrada sonora, uma letra sacana (Agora eu quero ser seu cachorro) tem a violência e o sarcasmo do punk, além de duplo sentido, uma vez que o cachorro pode ser o cara sacana, no popularesco feminino ou o cão, que simboliza o demônio:

"Agora estou pronto para fechar os olhos
e agora estou pronto para fechar a mente
e agora estou pronto para sentir sua mão
e perder meu coração nas areias ardentes"


A canção mais conhecida dos Stooges não é só um hino do Punk como também é um dos maiores clássicos do Rock como um todo, não só do Punk. Pode ser a Punk Rock Song Definitive, sem dúvida alguma. É uma forte candidata, senão a própria.

Mas não é a única. Richard Hell, que foi do Tevelision e depois escreveu a canção Blank Generation, já com o Voivoids (Richard Hell and The Voivoids), também um petardo e um clássico do Rock e do Punk. Embora um pouco menos conhecido do que Iggy e os Stooges, Richard Hell também é um dos precursores do que ficou conhecido como Punk Rock.

"Eu pertenço à Geração Vazia e
eu posso pegar ou largar isso a qualquer hora
Eu pertenço a Geração, mas
Eu posso pegar ou largar isso a qualquer hora


Quando Malcolm Mclaren voltou para Londres tão impressionado com Richard Hell e sua Blank Generation, pediu para que os Pistols escrevessem a versão britânica da canção. Então eles escreveram Pretty Vacant. Outro clássico da maior banda de Punk Rock da história. Se o punk nasceu nos porões de Nova York, no submundo das drogas pesadas e do sexo livre, foram os Pistols quem mudializaram a porra toda. E Pretty Vacant é mais uma das canções candidatas a Punk Rock Song Definitive. Claro que os Sex Pistols não poderiam ficar de fora. E foi muito difícil escolher uma só.

"Não nos peça para atender
Porque não estamos nem aí
Oh, não finja
Porque eu não me importo
Eu não acredito em ilusões
Porque muita coisa é real
Então pare, você é um crítico barato
Porque nós sabemos o que sentimos
Oh, nós somos tão bonitos, tão lindos e desocupados"


Por fim, a banda Punk com maior longevidade da história, os Ramones, também não poderiam ficar de fora. E, como os Pistols, difícil de escolher apenas uma canção. Mas pela letra semelhante às canções anteriores e pelo peso da canção, escolhi I Dont Care, que segue a linha das anteriores. Como todas as canções dos Ramones, rápida, direta e curta!

"Eu não me importo
Com este mundo,
Não me importo com aquela garota
eu não me importo com estas palavras!"


Todas têm o seu valor, são clássicos e demonstram bem o que foi, é e o que sempre será o Punk Rock. Para os futuros roqueiros, é imprescindível conhecer esse movimento que desbancou a chatice que estava virando o rock com os solos intermináveis do progressivo, regados a ácido. Em um tempo que Sexo Drogas e Rock and Roll não era apenas um bordão, mas uma realidade que demostrava a insatisfação dos jovens contra o status quo. Faça sua escolha pela canção mais poderosa! Árdua tarefa!

domingo, 11 de março de 2012

MORRISSEY - YOU SHOULD HAVE BEEN NICE TO ME

Mais sobre a trilha sonora do post. Morrissey, of course!


Você Deveria Ter Sido Bom Para Mim

Você poderia ter me dito
Na hora certa
Você poderia ter me apresentado orgulhosamente
Sem nunca ter que me beijar
Sem nunca ter nem mesmo que me tocar
Mas

Você deveria ter sido bom para mim
Você deveria ter sido bom para mim
Teria sido tão fácil

E nos momentos
Quando eu estava triste
Você poderia ter ficado lá
Você poderia ter ficado lá
Você poderia ter falado apenas uma vez em favor
Você nunca precisaria nem me tocar
Mas

Você deveria ter sido bom para mim
Você deveria ter sido bom para mim
Isso não lhe custaria seu dinheiro

E nos momentos
Quando eu me sentia triste
Não era para que você dissesse: "oh, eu te avisei"
Você poderia ter esperado

MORRISSEY - FIRST OF THE GANG TO DIE

Trilha sonora do post, continuação.



O Primeiro da Gangue a Morrer

(Los Angeles, você é quente demais)

Você nunca esteve apaixonado
Até que tenha visto as estrelas
Refletidas nos reservatórios

E você nunca esteve apaixonado
Até que tenha visto o amanhecer
Por trás do asilo de cegos

Nós somos os belos ladrõezinhos baratos
E você está nas nossas ruas
Onde Hector foi
o primeiro da gangue a ter uma arma na mão
E o primeiro a cumprir pena
E o primeiro da gangue a morrer
Oh, Deus
Hector foi o primeiro da gangue
A ter uma arma na mão
E o primeiro a cumprir pena
E o primeiro da gangue a morrer
Oh Deus

Você nunca esteve apaixonado
Até que tenha visto a luz do sol
Refletida nos ossos humanos esmagados

Nós somos os belos ladrõezinhos baratos
E você está nas nossas ruas
Onde Hector foi o
primeiro da gangue a ter uma arma na mão
E o primeiro a cumprir pena
E o primeiro da gangue a morrer
Que garoto bobo
Hector foi o primeiro da gangue
A ter uma arma na mão
E uma bala na garganta
E o primeiro rapaz perdido a ir
Para baixo da terra

E ele roubava dos ricos e dos pobres
E dos não muito ricos e dos muito pobres
E ele roubava todos os corações

MORRISSEY - THE MORE YOU IGNORE ME THE CLOSER I GET

Atrilha sonora do post não poderia ser diferente, num momento em que Morrissey se encontra no Brasil fazendo shows e conto histórias dos meus 40 anos.



Quanto Mais Você Me Ignora Mais Perto Eu Chego

Quanto mais você me ignora,
mais perto eu chego
Você está perdendo seu tempo
Quanto mais você me ignora, mais perto eu chego
Você está perdendo seu tempo

Estarei
no bar
Com minha cabeça no balcão
Eu sou agora
a parte principal
Da paisagem de sua cabeça
Quer você queira
ou não
Sim, eu fiz sua cabeça

Quanto mais você me ignora,
mais perto eu chego
Você está perdendo seu tempo

Cuidado!
Eu agüento má vontade
Mais do que os solitários juízes da alta corte
Quando você dormir
Eu rastejarei em seus pensamentos
Como uma conta que você não pode pagar
Tome o caminho mais fácil e desista
E me deixe entrar
Oh, me deixe entrar
Oh, me deixa entrar

É guerra

sábado, 10 de março de 2012

ALGUMA COISA ACONTECE NO MEU CORAÇÃO

No final de 1990 fiz o meu primeiro vestibular. A escolha da profissão foi algo meio esquisito, meio que ao acaso. Ok, não acredito muito nesse negócio de acaso. Na verdade nada acontece por acaso, tudo tem um porque de ser e só acontecerá se tiver que acontecer. É nisso que acredito. Ponto final. O que queria dizer é que me inscrevi no vestibular na Unesp no final de 1990 tendo como primeira opção Psicologia. Alguns anos antes, ainda sem ter definido o que fazer, lendo um dicionário em uma noite de insônia, sem ter algo mais interessante para ler, peguei o Aurélio. E nele li a definição da palavra esquizofrenia, meio que ao acaso... bem, não foi ao acaso, entende, porque aquilo mudou a minha vida. Foi o primeiro dia do resto da minha vida. Isso porque, pela definição que li naquela fatídica madrugada do final dos anos 80, em Santos, ao lado da linha do trem, olhando a cidade silenciada, pela janela da sala do pequeno apartamente da Campos Melo, quase de esquina com a Afonso Pena, me senti o próprio esquizofrênico. Aquilo que descrevia ali no dicionário era eu. Na realidade não foi na Campos Melo, mas anos antes, ainda no 141 da Júlio Conceição. Sim, isso mesmo, no início do Colegial.

Bem, tiveram outras influências na minha decisão, como a professora de Biologia (que era Psicóloga) do Primo Ferreira (ou Primo para os que estudaram lá) e que queria saber quem era o Márcio, que havia tirado a melhor nota na primeira prova que deu e ficou surpresa de ser eu, o mais bagunceiro do 3ºC1. Depois ela passou a me respeitar um pouco mais e a recíproca passou a ser verdadeira. E outros motivos que não lembro mais, sendo esses dois, por guardar na lembrança, os determinantes.

O dia do vestibular chegou. Não havia estudado ou feito cursinho. Queria desistir. Ir para São Paulo em plenas férias escolares, minha namorada Ana em Santos (ela era de Sampa) e eu tendo que subir a serra? Não vou... mas meu amigo Wagner insistiu, disse que eu teria que ir, não custava nada. E lá vou, mala nas costas, três dias seguidos em Sampa, mais precisamente em São Bernardo do Campo, na casa do meu irmão Beto. Quinta, sexta e sábado, de dezembro de 1990. No primeiro dia lembro de tê-lo encontrado na Avenida Paulista, onde eu faria a prova, em uma escola que não lembro o nome, perto do Shopping Paulista. E ele estava indo trabalhar. Ele me pagou um lanche no Bob's e cada um partiu para o seu rumo.

Lembro de sair da prova todos os dias e fazer hora para encontrar alguém em casa, pegar o metrô, ir para São Bernardo e esperar o dia seguinte. Na quinta e na sexta fui assistir a umas peças teatrais com sexo explícito ao vivo... era uma loucura aquilo. Os caras querendo me barrar e eu já tinha 18 anos. Tiveram que me deixar entrar. Saía de cada sessão alucinado...


Finalmente no sábado, depois dos três dias de maratona do vestibular, fui para casa, achando tudo muito fácil. Prova dissertativa. Durante dias e diante das perguntas dos que me acompanhavam e queriam saber como tinha ido, inclusive a mãe da Ana, respondia que tinha sido muito fácil e que no próximo ano faria cursinho e passaria com certeza. Só não sabia se tentaria Psico novamente. Porém, numa manhã de terça feira, fui comprar o jornal para a D. Elza, a minha chefe no escritório de Administração de condomínios onde eu trabalhava, O Estado de São Paulo e aproveitei, descrente, para ver o resultado do vestibular. E para minha supresa lá estava estampado o meu nome. Havia passado! Fiquei eufórico. Quando contei em casa, minha mãe ficou entre a alegria e a tristeza: o Rogério já havia saído anos antes para a Marinha do Brasil; o Beto morava em São Bernardo, onde estudava e trabalhava; o Fábio além de ter passado nesse mesmo vestibular da Unesp, só que em Bauru, para Jornalismo, estava em Londrina, fazendo a matrícula na Uel, onde também havia passado; e agora eu estava me preparando para alçar voos distantes. Só sobraria o Renato. Éramos seis...

Na realidade, se a memória não me falha nesse momento (tenho uma memória hipermetropéica, não é boa para coisas recentes, mas para o passado, quanto mais longínquo, mais perfeita - será isso uma característica da idade ou dos saudosistas?) o resultado saiu numa segunda feira. Não, foi numa terça mesmo. Tinha 4ª e 5ª feira para fazer a matrícula, me bandear para lugares nunca d'antes navegados (Assis-SP) imediatamente. Assim o fiz. De Santos, na época, não tínhamos ônibus direto. Fui para Sampa, rodoviária do Tietê. Me dirigi até o guichê da empresa que fazia São Paulo - Assis (Andorinha) e tenho a triste surpresa do valor da passagem era bem acima do que eu esperava; dinheiro da época devia ser o Cruzeiro do Collor. Então eu tinha tipo 200 pilas para ir, voltar, comer, enfim, para todas as despesas. Vi que a passagem era tipo uns 120 pilas. "Fudeu", pensei... numa época em que não existia a facilidade do dinheiro de plástico como hoje, rodei a rodoviária pensando em uma saída, até que cheguei à conclusão, voltar para Santos, pegar grana com minha mãe e retornar para Sampa e prosseguir com meu destino. Mas antes, pensei, vou já garantir a ida. Quando fui comprar a passagem, era bem abaixo do que estava marcado, aquele preço era para ônibus leito. Comprei a passagem para às 24 horas e fiquei rodando por Sampa, cheguei até a casa do meu tio.

Preciso refazer esse percurso qualquer dia desses, sair de Santos, pegar o busão para Assis na Rodoviária do Tietê e chegar lá de madrugada. Tenho pensado algumas vezes nisso, mas ainda não deu certo. Reviver alguns momentos da minha vida, acho que isso é chegar à maturidade, tentar reviver alguns momentos da experiência vivida ao longo dos anos.

Estava careca, porque meus amigos fizeram questão de me ferrar lá na famosa rua São Paulo, em Santos. Na rua que meu tio morava, que não era mais a Fabiano Alves, mas continuava sendo na Vila Prudente, tinha umas gurias que eu conhecia e modéstia à parte, fazia sucesso; eram elas: Claudia, Vânia e Mena. Quando souberam que eu estava por lá, ficaram rodeando a casa do tio. A tia comentou que elas estavam lá por minha causa, porque nunca a tinham visitado - no caso minha prima Patrícia (elas moravam na Fabiano Alves, algumas quadras abaixo da Avenida Prudente). Foi a última vez que as vi, e que vi meu tio e tia, primos. Houve então um hiato de quase 20 anos, quando os visitei em 2010, já em Bombinhas-SC, para ser mais exato em Porto Belo-SC.

Tudo transcorreu normal, mesmo sem nem saber para que lado ficava Assis, cheguei vivo e o motorista anunciou a cidade. Tive que subir a Getúlio Vargas, umas 4hs, 5hs da manhã - não tinha 'circular' (como chamavam o transporte coletivo) àquelas horas - até o mercado onde os ônibus se concentravam para começar a circular. E lá tinha o que levava até à Unesp. Nesse meio caminho, passamos por uma rádio, Antena Jovem, sintonizei no meu Walkmann, mas qual não foi minha surpresa em escutar uma rádio FM tocando música sertaneja. Credo! Achei esquisito, mas voltei à minha fita dos Smiths (Strangeways Here We Come). Uma senhora se compadeceu da minha situação de perdido aos 18 anos em um mundo distante e me acompanhou até o local adequado, me mostrando a circular que deveria pegar. Acho que mais eu fiz companhia para ela do que o contrário, porque foi conversando e colocando o assunto dos netinhos em dia.

Nos primódios dos anos 1990 eu tinha uma fita do Smiths (Strangeways Here We Come, como citei acima) que me acompanhou muito durante esses anos, nas minhas idas e vindas de Assis para São Paulo/ Santos e vice versa. Lembro de ficar acordado a noite inteira, olhando pela janela o horizonte, por vezes o nascer do sol, ao som de Last Night I Dream't That Somebody Loved Me (A noite passada sonhei que algúem me amava).



E assim daquela primeira vez, o dia clareando, eu dentro do ônibus (a tal circular), no primeiro lugar à direita do motorista, até chegar na Unesp para a matrícula. Lá conheci um carinha, com seu pai e sua namorada, todos de Piracicaba. Não recordo o nome, mas lembro que dias depois (alguns meses) ele surtou e sumiu do mapa e durante aquele primeiro ano ele aparecia e sumia com uma grande frequência, até que sumiu de vez, voltando no ano seguinte. Muito comum naquele começo dos 90 a galera de Psico da Unesp dar um pirada. Fosse nas drogas ou na solidão que a distância de casa proporcionava. Dos 40 alunos da minha sala, apenas 2 estavam em casa; os demais eram de fora.


Eu seguia minha vida, fazendo sucesso com as meninhas do bairro (nessa época morava na Osvaldo Aranha), até que em abril de 1991 conheci aquela guria que na hora percebi que seria a mulher da minha vida, aquela que eu levaria para o altar, ter o Victor Hugo e/ ou a Paula Beatriz e que queria viver para o resto dos meus dias, fossem mais 20 , 40, 80 anos: a Juliana. Com seu olhar meigo, os olhos da cor do céu, os cabelos levemente encaracolados, ainda reflexo da moda da década anterior, o sorriso encantador e uma voz doce e macia, aveludada; a pele alva que ruborizava facilmente, deixando as bochechas vermelhas, compunham o charme daquela guria pela qual me apaixonei perdidamente. Um contraste entre o azul dos olhos e o vermelho/ rosado das bochechas... como se Grêmio e inter estivessem em uma mesma pessoa, amor e ódio... ódio e amor, tudo na mesma pessoa, o tempero perfeito para uma paixão devastadora, sem medir consequências, insana... não queria mais saber de ninguém, só dela.

Mas essa história fica para o próximo post. Nessa época a trilha sonora da minha vida se baseava em Smiths (claro), Morrissey, o rock inglês como um todo (Jesus And Mary Chain, Sister Of Mercy, The Cure, Joy Division, e tantas outras bandas) e no rock nacional, TNT, Cascavelletes, Legião, Nenhum de Nós, Engenheiros...



LEGIÃO URBANA - A FONTE

Trilha sonora do último post.



A FONTE

O que há de errado comigo
Não consigo encontrar abrigo
Meu país é campo inimigo
E você finge que vê, mas não vê

Lave suas mãos que é à sua porta que irão bater
Mas antes você verá seus pequenos filhos trazendo novidades

Quantas crianças foram mortas dessa vez?
Não faça com os outros o que você não quer
Que seja feito com você
Você finge não ver e isso dá câncer

Não sei mais do que sou capaz
Esperança, teus lençois têm cheiro de doença
E veja que da fonte sou os quilômetros adiante

Celebro todo dia
Minha vida e meus amigos
Eu acredito em mim
E continuo limpo

Você acha que sabe
Mas você não vê que a maldade é prejuizo
O que há de errado comigo?
Eu não sei nada e continuo limpo

Ao lado do cipreste branco
À esquerda da entrada do inferno
Está a fonte do esquecimento
Vou mais além,não bebo dessa água
Chego ao lago da memória
Que tem água pura e fresca
E digo aos guardiões da entrada
"Sou filho da Terra e do Céu"

Dai-me de beber, que tenho uma sede sem fim
Olhe nos meus olhos, sou o homem-tocha
Me tira essa vergonha, me liberta dessa culpa
Me arranca esse ódio, me livra desse medo

Olhe nos meus olhos, sou o homem-tocha
E esta é uma canção de amor
E esta é uma canção de amor

REMEMBRANÇAS DOS 40

Em 1984 eu estava na 4ª série e foi um ano diferente, cheio de coisas não habituais ou fora do comum. Primeiro que 1984 é uma obra clássica de George Orwel, onde ele mostra uma sociedade controladora e onipresente, fruto de sua imaginação de como os estados totalitários seriam décadas à frente. Foi daí que foi tirado o tema Big Brother, pois na concepção de Orwel o futuro seria um lugar onde todos os seus passos seriam controlados e seguidos pelo Grande Irmão. Hoje é quase assim, mais por nossa opção do que por controle do Estado, uma vez que nos expomos cada vez mais em redes sociais. Mas isso é um assunto para outro post, uma vez que pode ser aprofundado e melhor discutido.

Mas voltando ao ano de 1984 e deixando de lado o livro homônimo, estava na 4ª série e fui estudar no Cleóbulo Amazonas Duarte. Foi o único ano que não estudei no Dino Bueno, no meu 1º grau (o que hoje corresponde ao Ensino Fundamental); da 1ª até a 3ª série o Dino Bueno era uma Escola Estadual. Mas no final da 3ª série nos transferiram automaticamente para o Cleóbulo, pois diziam que o Dino fecharia. Porém, no ano seguinte o Dino reabriu como Escola Municipal. Não fiz pré escola, apenas o Jardim de Infância, ainda em Porto Alegre, cuja minha professora chamava Darci Veríssimo, parente do maior escritor brasileiro de todos os tempos, Érico Veríssimo.


A escola era o Grupo Escolar Ceará, que visitei recentemente na minha última passagem por Porto Alegre. Minha impressão infantil, de 6 anos de idade, é que tinha que atravessar a cidade para chegar em casa. Mas quando vi, ano passado, que bastava andar pouco menos de duas quadras, percebi o quanto vemos o mundo grande quando somos pequenos e que a medida que vamos crescendo ele parece diminuir. Lembro claramente de ter que atravessar a avenida Teresópolis, passar em frente de um supermercado (hoje o Supermercado Nacional), virar à direita e uma quadra à frente, quase de esquina, chegar em casa, no 1073 (líamos dez setenta e três) da Clemente Pinto. Ou seja, não mais do que 500 metros. Mas a impressão de um guri de 6 anos é bem diferente de um guri de (quase) 40. Ainda bem!


Ainda no Grupo Escolar Ceará, lembro de um guri muito amalucado, esses pestinhas da sala, que ninguém continha e todos temiam. E não é que eu sempre ficava esperando minha mãe buscar, ela sempre se atrasava e por coincidência ele também esperava a mãe, que também demorava para buscá-lo? E ficávamos sempre os dois sozinhos; eu morrendo de medo dele fazer alguma coisa contra eu, ele fazendo suas traquinagens, que nem sequer lembro quais eram.

Mas voltando à 4ª série lá fui eu para o Cleóbulo. Lá tinha uma amigo, Ricardo, cuja história já devo ter contato aqui no blog. Nós odiávamos um gato que ficava ronronando pelo pátio da escola. Isso nos incomodava. Bolamos inúmeros planos para maltratar o gato que tanto nos demandava aquele sentimento negativo. Até que um dia colocamos em prática um dos planos diabólicos: no final da aula fomos para o pátio, atraímos o gato e Ricardo o pegou pelo rabo e girou o corpo com os braços abertos e o gato seguro pelo rabo; depois de alguns giros soltou o gato, saiu como um louco. Os grunhidos do gato foram ouvidos na diretoria e fomos parar lá. Resultado: Ricardo suspensão e eu uma covardia e uma vergonha que carrego pela vida toda, pois deixei o Ricardo sozinho e fugi. Na época não sabia nem como encará-lo na sua volta às aulas, depois do castigo. Sentia que deveria ter sido punido também, mas me impus uma punição que me persegue pela vida. Mas pelo menos o gato sumiu, ao menos é que minha fraca memória me conta nesse momento.

Minha professora dessa época era um pessoa autoritária, antipática e muito braba; enfim, uma megera. E por isso aconteceu o que relatarei aqui, que é cômico e também faz parte das lembranças vergonhosas da minha vida... tínhamos voltado do recreio e eu estava apertado, não gostava de ir no banheiro para fazer cocô na escola. Uma que nunca tinha papel higiênico e outra que era muito sujo. Então resolvi segurar até chegar em casa. Entretanto, ao voltar para a sala de aula percebi que meu intento seria difícil, praticamente impossível. Fiquei relevando, relevando, segurando, com medo de pedir para a professora para ir ao banheiro e ouvir um sonoro não até que não aguentei e ... sim, resolvi que faria cocô nas calças (kkk). Que idéia idiota. O cheiro logo se espalhou pela sala e o mesmo Ricardo aí de cima me questionou se eu tinha pisado em cocô, porque o cheiro exalava. Lembro de ainda olhar na sola do sapato para mostrar que não havia pisado. Sorte minha que na sala de aula ficou por isso mesmo, sem mais desconfianças ou comentários. Acho que ninguém percebeu o trágico ocorrido.

No caminho da escola para casa, do canal 3 para o 2 (morava no 123 da Espírito Santo) - quem conhece Santos entenderá que era uma boa caminhada, sentia que o cocô ía descendo pelas pernas. Eu, na minha idiotice, ao invés de passar no banheiro no final da aula, para limpar, tirar o cocô, dar um jeito na merda (literalmente) que havia feito, tomei mais uma decisão desastrosa de me limpar em casa. Quando cheguei perto de casa, já todo cagado pelas pernas (kkkkk será que terei coragem de publicar essa porra?) encontrei uma guria amiga no caminho. E não é que a desgraçada resolveu puxar conversa? E eu lá, todo cagado. Foi umas das piores experiências da minha vida. Mas consegui superar. E hoje é motivo de risos e piadas em família. O Tety e o Gui vivem me zoando por causa disso.

No meio desse ano, por problemas financeiros e de estrutura, fui passar uma temporada na casa do tio Luiz, em São Paulo, na Fabiano Alves (não lembro o número) na Vila Prudente, perto da Mooca. Anos mais tarde fui saber que lá tinha a maior favela da cidade. Mas nunca vi nenhuma favela. Terminei a 4ª série no André Dreyfus. E no ano seguinte, na volta a Santos, voltei para o Dino, onde comecei o ginásio e fui até a 8ª série. Mas no meu histórico do 1º grau está todo no Dino Bueno. Depois fiz o segundo grau no Primo Ferreira. Mas isso é outra história e ficamos por aqui, com algumas remembranças desses 40 anos de vida, as 4 décadas da vida de um cara que ri das desgraças e sorri para as dificuldades.

Bem, só uma correção: na verdade o ano era de 1982. Mas resolvi deixar o erro do início, porque perderia todo o primeiro parágrafo e parte do segundo, uma vez que teria que suprimir o que escrevi sobre a obra prima de George Orwel.

Hasta lá vista, baby!

terça-feira, 6 de março de 2012

HISTÓRIAS QUE A BOLA NÃO CONTA

"Eu não vi Kennedy morrer
Eu não conheci Martin Luther King
Eu não tenho muito para dizer...
Nasci em 72, nasci em 72"

Adaptação da canção Nasci em 62 da banda paulistana Ira!



Nasci em uma quarta-feira de uma semana santa. Início do outono em Porto Alegre, no Hospital Ernesto Dorneles, exatamente às 15 horas de um dia chuvoso. Deve ser por isso que eu gosto tanto de dias cinzentos; deve ser por isso que o Outono é a estação do ano que eu mais gosto. As folhas caindo no chão, o clima nem quente nem frio, as árvores secas... bem, para falar a verdade não sei se era um dia chuvoso o dia 29 de março de 1972. Só escrevi assim porque achei que ficaria mais poético.

"... Veja você, quem diria que ironia,
Desconbri que sou feliz...

Sonhei com meu pai e ele soria,
Chimarrão pra acordar, era só o que eu queria..."

Versos da canção Outono em Porto Alegre, da banda gaúcha Engenheiros do Hawaii.



Em 1972 passava na tv, provavelmente preto e branca em praticamente todos os lares desse país, uma novela, da qual eu não sei o nome, poderia até perguntar para minha mãe, mas sempre esqueço de o fazer; o que importa é que nessa novela havia um casal de protagonistas. E a D. Sirley na 4ª gestação, esperando e desejando uma guria, a tão sonhada guria. O casal da novela era formado pelo Márcio e pela Thais. Coincidentemente (se alguém acredita no destino...) havia uma amiga da minha mãe que também estava grávida. E desejava ter um guri. Seria o Márcio e a Thais seria a filha da Sirley. Assim ficou combinado, mas esqueceram de combinar com Deus. E esse esquecimento custou à Sirley 'perder' a Thais e ganhar o Márcio e a sua amiga ganhar a Thais. Assim foi escolhido o meu nome, meio que ao acaso com a surpresa de ter nascido um guri ao invés da guria que a Sirley ainda tentou mais uma vez, sem sucesso. E alguém aqui acredita nas linhas que o destino escreve? Bem, eu gostaria de conhecer a Thais, mas acho que a vida não será tão genorosa assim...

Lembro da minha avó, na verdade bisavó materna, a italiana que nos levava na missa desde pequeninhos. Não conheci minha avó paterna e materna e nem meu avô paterno, o velho Laudelino. Mas conheci a bisa e seu filho, meu avô, embora só tenha sabido muito tempo atrás que era meu avô. Uma história e tanto, que fica para um outro dia. Quem sabe um livro ou um roteiro de filme? Já pensei muito sobre isso.


O fato é que eu era vidrado nessa (bis) avó. Lembro de todas as noites, quando era viva, durante a madrugada, andar pela casa, atravessá-la, para chegar ao seu quarto e me deitar aos seus pés, porque na cabeceira estava o meu irmão mais velho Rogério, que dormia sempre com ela. E assim ela me apelidou de Coruja. Tenho algumas lembranças de minha (bis) avó. Mas não recordo do seu rosto. Morreu em 1976, último ano de um jejum de 8 anos do GRÊMIO sem ganhar um Gauchão (o fez em 77, com o famoso gol de André Catimba e seu salto mortal que deu errado - time comandado pelo saudoso Telê Santana). Lembro do dia do enterro dela, o Rogério com 10 anos, aquela movimentação de velório, mas da qual nem eu e nem os demais irmãos participaram. Eles nos excluiram por sermos muito pequenos e não pude me despedir daquela velha senhora que tanto eu amava, sem nem saber direito o que era o amor. Eu tinha 4 anos. Acho que essas 'escapadinhas' durante a madrugada demonstravam o meu espírito transgressor, a minha inquietude com as leis e regras... tenho vivo na memória esses dias (noites/ madrugadas) que atravessava a sala, a sala de jantar, a cozinha, para chegar no quarto da vó. E como era tão pequeninho, parecia que cruzava o mundo... o real para o imaginário.

Depois que ela morreu, seu quarto virou o quarto da fantasia (o que para eu já era em sua vida), o quarto que podíamos brincar e bagunçar. Foi intitulado o "quarto da bagunça". Tenho uma lembrança estranha, que deve ter se misturado com fantasia: dias depois de sua morte ela subindo a escada que dava para o porão, de branco, como uma nuvem... e me falando para eu aproveitar ao máximo a vida, porque morreria com 45 anos. E trago isso comigo pela vida toda.

O que é realidade e fantasia na vida de um guri de 4 anos? E num guri de 40 anos?


segunda-feira, 5 de março de 2012

PAIS E FILHOS

Pais e Filhos é uma canção da Legião Urbana do disco As Quatro Estações, o quarto disco da banda. Engraçado que eu nunca curti muito a canção, mas depois que o Tety nasceu que eu me dei conta de que eu não era mais apenas um cara que ralava na vida em busca de dias melhores e sim alguém que precisava cuidar e criar um serzinho que eu via no berço nanando e por vezes com o cabelinho (loirinho, loirinho) suadinho e o rosto avermelhado por alguma bagunça que fazíamos pela casa. Lembro de algumas passagens nos primeiros anos de vida do Tety, como em jogos do GRÊMIO na casa lá da Paranaguá 2233. Nós delirávamos, aquele GRÊMIO da década de 90, com Jardel, Paulo Nunes, Dinho, Arce, Rivarola, Danrlei e principalmente Felipão, era demais; também brincávamos de carrinho, pelo chão da sala, eu de um lado, ele de outro, empurrando os carrinhos para se baterem de frente. Eu fazia fricção e ele idem, mas eu costumava abrir as portas e o Tety ficava muito doido, reclamava e chegava até a chorar por vezes, tendo como pano de fundo a Juliana na cozinha, fazendo alguma coisa gostosa para comermos; e de lá vinham os gritos para que eu parasse de provocar o menino: - não deixa o menino nervoso! E lá mandava eu o meu carrinho com as portas abertas - opa, esqueci, bah, que mancada! O Tety - póta abéta não! PÓTA ABÉTA NAAAAAAAAAOOOOOO! Eu achava tão bonitinho ele falar assim que fazia de propósito só para ouvir a pronúncia dele, tão bonitinha. E também eu gostava de zoar com ele.


Então ele cresceu mais um pouquinho e com uns 3 anos começou a escutar Legião. E a música que ele mais gostava era Pais e Filhos. E eu passei então a gostar também. Porque éramos nós dois, pai e filho. E nossa relação sempre foi maravilhosa. Ele com aquela roupinha do GRÊMIO que o tio Fábio fazia questão de presenteá-lo todos os anos, oficial, o conjuntinho inteiro, camisa, shorts, meião; e o Tety com o cabelinho loirinho, loirinho, rosto branquinho avermelhado por correr atrás da bola dentro de casa. Lembro que sempre pensava que quando criança a D. Sirley não nos deixava jogar bola dentro de casa. O tio Fábio sempre fazia esse comentário. Daí o Tety fez 3 anos. E eu queria que ele deixasse de chupar chupeta. Então compramos uma bola do GRÊMIO, número 3, e quando dei o presente disse: - Agora que tens 3 anos, ganhou uma bola do GRÊMIO, então não precisa mais chupar chupeta, já está ficando grande. Ele me deu a chupeta e nunca mais pediu. Esse guri sempre foi demais!

E como ele era lindo. Como ele é lindo! Mas quando bebê, era o verdadeiro bebê Johnson. Cabelinho loirinho, loirinho, pele clarinha, branquinha, olhos de um azul da cor do céu... e todos ficavam encantados e nós dois, eu e a Juliana, pais corujas, ficávamos extremamente envaidecidos; e tio Fábio também; o tio Renato idem; a vovó Sirley então... e além de lindo, sempre foi muito inteligente. Era como queríamos nosso bebê: lindo como a mãe e inteligente como o pai. E Deus nos presenteou com um filho exatamente como desejamos.

Por isso e por muito mais, passei a gostar de Pais e Filhos. Foi a partir da minha experiência como pai, em 1993, com 21 anos, ainda em Santos, na Primavera santista... novembro. 3 de novembro. Eu não queria saber o sexo do bebê; a Juliana também não queria; somente quando internou para ele nascer que o médico falou o sexo. E então soubemos que o Victor Hugo nasceria dali a algumas horas. Estávamos em dúvida se seria a Paula Beatriz ou o Victor Hugo. Paula Beatriz seria a junção de dois nomes que adoro, além de ser uma homenagem à avó paterna (Sirley Beatriz, a Alves como o Flamarion - o avô paterno a chama), que a vida inteira desejou ter uma filha e não teve; e desejou (continua desejando) ter uma neta, mas não teve (ainda! Mas não será minha); acho que não terá! São 5 filhos e 5 netos, todos machos; Victor Hugo homenagem ao autor de Os Miseráveis. Paula Beatriz é o nome para a filha que sempre quis ter, desde os 10 anos tinha esse nome em mente. Mas o primeiro filho eu queria que fosse o Victor Hugo. E foi o primeiro neto da Alves.


Ser pai foi uma das emoções mais maravilhosas que tive. Indecritível! Em 2010, conversando com meu tio Luiz, que foi dessa para melhor no final do ano passado, disse que faltava eu escrever um livro para completar minha vida; conversávamos sobre a experiência maravilhosa e única da paternidade. Algumas pessoas passarão por essa vida sem essa experiência. É como passar em branco.

Nesses 40 anos de vida, tem várias experiências e histórias para serem contadas. Vou tentar colocar algumas das mais interessantes ao longo desse mês. E no dia 29, quem sabe, um texto para fechar com chave de ouro. Abaixo a versão de Pais e Filhos que mais gosto, está no disco póstumo da banda: As Quatro Estações Ao Vivo. Eu tinha essa versão gravada de uma rádio de Tupã - SP, que gravei em uma fita quando morava em Assis, no início dos anos 90. E era uma versão toda cheia de chiados, uma vez que escutar uma rádio de outra cidade sempre dava esses problemas.