sábado, 3 de novembro de 2012

QUARENTENÁRIO V


O ano era de 1988. Estava no 2º ano do colegial, o que hoje se chama ensino médio. O cenário era a Escola Estadual Professor Primo Ferreira, ou apenas 'Primo' para os que ali estudavam ou no meio acadêmico santista daquela década. Era uma das escolas mais conceituadas da época, um desafio para quem estudava lá e por isso a escolhi para fazer o colegial. Era um desafio. Amigos dos meus irmãos mais velhos estudavam há anos e não conseguiam sair, diziam que eu seria mais um dos que nunca mais sairiam. Não conheciam a minha fama de CDF. O Quinho, que foi dessa para melhor há alguns anos atrás após se levantar da cadeira em um assalto no boteco que ele se encontrava em São Vicente, cidade vizinha de Santos e assustar os assaltantes que deram tiros direcionados a ele e que infelizmente o acertaram fatalmente (cara, tu sempre farás muita falta nesse plano aqui) sempre me dizia que me arrependeria, porque lá era foda. Eles acho que nem conseguiram terminar o colegial lá, depois fizeram um supletivão, no tempo em que supletivo tinha regra e era bem estruturado. Eu fiz em 3 anos, sem nem ao menos levar alguma recuperação. Sempre fui bom aluno.

Mas em 1988 estava no segundo grau, era do 2º C1 e o Marcelo Marmita, amigo do Fábio, cujo apelido eu e meu irmão Renato demos carinhosamente de Marcelo Orelha, porque tinha uma orelha mais para fora do que a outra, que estudava no Primo, fazia parte do Grêmio Estudantil e resolveram fazer uma gincana, que tinha xadrez, futsal, vôlei, com uma competição para ver qual estudante sabia mais de conhecimentos gerais. Tinha ainda uma competição de karaokê e uma paródia de uma música. Me inscrevi no xadrez, participei do time que deu vexame no futsal, fiz a paródia e cantei "Eu Não Matei Joana Dar'c" do Camisa de Vênus. Queriam que eu participasse da competição de conhecimentos gerais "Quem Sabe, Sabe", mas tinha uma guria que queria muito participar e deixei, já que estava em quase todas as demais competições. Tinha uns malucos nazistas na sala, que nos batizou de Nazifacistas do 2C1. Idiotice, mas tudo bem.

No xadrez, como ninguém me conhecia, supreendi a todos por vencer na primeira rodada o cara que era tido como o grande favorito. Depois da vitória, todos na sala ficaram estupefatos e quiseram jogar comigo. Ganhei de todos, um a um, amistosamente. Ainda tive que ouvir um presunçoso "só ganhou essa, te encontro na final". Mas fui ganhando jogo a jogo até chegar na final e pegar aquele primeiro adversário. Com platéia e tudo, contra eu, venci novamente o meu convencido oponente. Medalha de ouro para o 2C1. 

No futsal a galera era ruim demais e fomos humilhados jogo atrás de jogo. Logo eu, que tinha vencido na 8ª série o último campeonato no Dino Bueno, de futebol de praia, o primeiro organizado pelo professor Júlio, de educação física (nos outros anos nós quem organizávamos). Mas perdemos os três jogos da fase de classificação e ficamos em último no grupo, sem chances de classificação.

Quando cantei "Eu Não Matei Joana Dar'c" foi um escândalo e quase fui desclassificado, porque cantei a estrofe "eu nunca tive PORRA nenhuma, com Joana Dar'c". Imagina, falar porra era contra a moral e os bons costumes... quem diria, que mundo era aquele que vivíamos. Mas sim, não podia ser dito palavrão em público. Gurizada do século XXI, vocês estariam fudidos!

Por fim, cantamos em coro, a canção Panacas, uma paródia para a canção Psicopata, do Capital Inicial. Algumas particularidades são importantes de serem ditas antes de deixar a letra da paródia. A diretora, cujo nome nesse momento não me recordo, sempre buscava os alunos que queriam matar a primeira aula na porta da escola (o nome dela era Mari alguma coisa); havia um professor de desenho geométrico chamado Vandevaldo, que era o bicho, a galera tremia de medo dele. E muitos não saíam do primeiro ano por causa dele; era uma época que os alunos tinham mania de soltar rojões nos banheiros das escolas e já havia acontecido isso nos banheiros masculinos do Primo. Dito isto, aí vai a paródia:

"A chuva caiu na segunda feira
não vou entrar, 
vou perder a primeira

Primo Ferreira me maltrata, 
Estou virando um panaca

A diretora, vai nos buscar, 
não tenho escolha 
sou obrigado a entrar

Primo Ferreira me maltrata, 
Estou virando um panaca

Quero soltar bombas no banheiro
Pichar o muro do colégio inteiro, 
Não quero mais entrar na aula
Tô de saco cheio de biologia
Se aparece o Vandevaldo, 
Adeus toda orgia."

Nunca gostei de biologia, por isso o verso de saco cheio. E o professor de biologia dava aula olhando para o teto.

Muitos ficaram com medo de cantar a parte que falava do Vandevaldo, com medo de represálias, mas não deu em nada, menos do que o porra citado acima. Eles (tanto a diretoria quanto o professor citado) deram risadas no final das contas.

O Primo Ferreira fica no bairro da Vila Belmiro, alguns poucos metros do estádio Urbano Caldeira, mais conhecido como Vila Belmiro, do Santos e sempre que tinha jogo nós saíamos mais cedo para dar uma secada no time da casa. A maioria das vezes tínhamos êxito. Depois, quando o França, da nossa sala, foi profissionalizado, íamos torcer por ele. Ele andou pelo Vasco naquela época, mas depois sumiu de vez, não sei por onde anda ou andou.

Lembrei dessas histórias agora à pouco, pois a Juliana estava escutando algumas canções nacionais e uma delas era Eu Não Matei Joana Dar'c. Camisa de Vênus foi uma das bandas mais punks do cenário baiano de todos os tempos, mais na atitude do que no som, que era puro rock and roll, da melhor qualidade. Pena que tudo um dia chega ao fim e que tudo que é bom dure tão pouco.

P.S.: lembrei do nome da diretora que era o terror nos anos 80: dona Maricleia.

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