Quando a Mayday terminou? Quando
fui embora estudar na Universidade? Quando nos alistamos no exército ou nas
forças armadas? Não, porque ninguém de nós serviu às forças armadas. Vivíamos
um período de crise econômica profunda e as forças armadas estavam sem grana
para manter um enorme contingente apenas para satisfazer seu desejo sádico de
massacrar e humilhar. Não tinha o porquê de manter aqueles que não desejavam
ser esculhambados, apenas os masoquistas que queriam passar por essa
experiência ‘única’ é que foram ‘escolhidos’ para servir à Pátria.
Para falar a verdade eu não sei
quando a Mayday acabou. Acabou sem começar. O sonho acabou. Não tivemos uma
Yoko, não teve briga, não deixamos de ser amigos, grandes amigos. Apenas nos
afastamos naturalmente. A vida nos separou, nossas escolhas individuais nos
separaram. E cada um foi seguir o seu rumo. Fui para a Universidade, o Zé
Renato se aprofundou nas suas idéias revolucionárias e virou o maior punk de
todos nós, montando uma banda punk que chegou a se apresentar na concha
acústica do canal 3, o Branco foi sei lá o que fazer, fazer das suas. E o
Ronaldo entrou numas de drogas, afogar as angústias e frustrações, se enrolou
em um romance moderno para aqueles loucos dias de final dos anos 1980, curto e
sofrido, como todas as paixões avassaladoras. Até que encontrou a (sua)
salvação no Hare Krishna. Mas o lance com o Hare Krishna demorou mais uns anos
para rolar. Antes disso montamos uma banda.
Também não sei porque a banda
acabou. Não me recordo exatamente o momento e o motivo. Não sei se isso foi
definido ou simplesmente deixamos o sonho de lado. Vou perguntar para o Zé
Renato ou para o Ronaldo, que o Renato, meu irmão ficou de me passar o contato.
Quem sabe eles lembram.
Passado algum tempo do final da
Mayday, já nos anos 1990, eu, Ronaldo, Nair e um guri da rua São Paulo,
montamos uma banda e começamos a ensaiar em um estúdio. Já tinha trancado a
Psico em Assis e estava em mais uma fase em Santos. Aquela cidade parecia me
puxar como um imã e me prender em suas ‘fronteira’ com a serra do mar e com o
Oceano Atlântico.
Com essa formação, a banda
iniciou os ensaios e pouco tempo depois o Ronaldo queria se apresentar em um
festival que teria em Humaitá, um bairro novo bem longe, muito longe do que se
conhecia à época como a cidade de Santos. Era o que começamos a chamar de
periferia de Santos. Humaitá era para onde Santos empurrava a população mais
carente, a população mais pobre. Era em Humaitá que o Ronaldo morava. Na
realidade, se apresentar em Humaitá para o Ronaldo seria a glória; uma forma de
mostrar que ele não era só um neguinho maconheiro que andava sem rumo, mas um
futuro astro de rock.
“Tudo isso aconteceu há mais de
20 anos e vieram hippies e tanques...”
Isso ocorreu na minha fase mais
star, tanto que os caras me chamavam de Márcio Star, porque eu estava chato pra
caralho, pedante, nojento, me achando o cara mais fudido de todos, um pop star
de porra nenhuma. Então não aceitava nada que não tivesse sido criado por mim.
Por isso que a banda não deu certo. Vários ensaios e não tínhamos nome. O
Ronaldo querendo nos inscrever no festival e nós sem nome. Como eu estava
nojento e irredutível, os caras começaram a não submeter as idéias à minha
aprovação, porque eu não aceitava nada que não fosse criado por mim.
O Ronaldo era o batera, o Nair
ficou com o baixo, eu com a guitarra e o violão e o carinha da rua São Paulo
era o vocal, se arriscando no violão também. Eu fazia as letras e as músicas,
claro; e aceitava pouca interferência dos outros, que dirá trazerem uma letra
ou uma música. Porém, a principal canção foi feita no ensaio mesmo, uma linha
de baixo aqui, um riff de guitarra e canta qualquer porra aí. Assim surgiu
nosso principal hit, que era tão bom que eu não lembro da letra e nem da
música.
O Nair, apelido do André, era um
punk que andava com o China (também André, que havia estudado com meu irmão
Fábio no Dino), também punk. Aliás, os caras que andavam com eles, Branquinho e
outros, eram os punks que nos antecederam em Santos. Como em São Paulo, haviam
tribos diferentes de punks. Nós andávamos com a periferia, os caras de Cubatão,
enquanto o China e o Nair com os punks ‘ricos’.
A diferença de idade também
contava, porque eles eram 3, 4 anos mais velhos que nós. Mais tarde, quando
montamos a banda, essa diferença já não pesava mais.
Os caras estavam numas de ler
Paulo Coelho, fãs de Raulzito; eu detestava Paulo Coelho, escutava pouco Raul
Seixas, preferia o rock inglês. Daí os caras jogaram na roda o nome da banda:
Alquimia. Eu não aceitava esse nome, claro, na minha teimosia, mas também não
tinha nada melhor para sugerir. Aquilo me soava meio pagode, nunca gostei desse
nome e até hoje não daria o nome para a banda. Mas foi ficando, mesmo contra a
minha vontade, um semi deus prepotente e idiota.
Depois de vários ensaios, eles se
encontravam, andavam juntos o tempo todo e eu ficava na minha, seguia minha
vida normal sem a banda. A Juliana estava grávida do Victor, eu tinha um outro
ritmo de vida, bem diferente deles, que estava mais para drogas e rock and
roll. E eu constituindo família. Eu não fazia parte da banda, era apenas o
guitarrista e compositor da banda, nada mais... não era um deles. Não tinha
unidade, não tinha banda. Não para mim, no meu isolamento de estrela.
Depois de vários ensaios, certa
feita cheguei no estúdio que alugávamos para ensaiar, sozinho e eles já estavam
lá, chegavam juntos e iríamos começar a tocar a música que fizemos, mas daí os
caras tinham mudado tudo e eu chiei pra caramba. Onde já se viu fazerem isso
sem me consultar. Depois de nenhuma discussão, mas de imposição minha e muita paciência
da galera, começamos o ensaio. Os caras preferiam não contrariar.
Então, contra minha vontade e sem
eu saber os caras nos inscreveram para esse tal festival. Com o nome de
Alquimia. Quando vi o cartaz do show, fiquei muito, mas muito fudido. Aquela minha
vaidade idiota falando mais alto, me tornei um ignorante-arrogante, na minha
teimosia cega.
Mas nesse aspecto eu tinha
argumento. E não era apenas minha teimosia que queria falar mais alto. Não
estávamos preparados para nos apresentar, tínhamos ensaiado apenas duas ou três
canções. Mas não estávamos em sintonia, nem dentro e muito menos fora de
‘campo’. Lembrei o Ronaldo, o único que me escutava, que aceitava a minha
teimosia com uma paciência de Jó, das apresentações das bandas no extinto
programa Som Pop da TV Cultura, nos anos 1980, cada uma pior que a outra; disse
para ele que se nos apresentássemos naquele momento, esse seria o nosso
destino. E vaias, muitas vaias.
Meu poder de argumentação foi o
suficiente para o Ronaldo e os demais desistirem da empreitada. Eles meio que
queriam tocar na marra, mesmo sem estarmos preparados. Perceberam, a tempo, que
seria impulsividade.
Não lembro quem montou a banda.
Não lembro como a banda terminou. Mas sei que não tinha mesmo como dar certo.
Meu ego inflado não deixaria nada que eu não comandasse dar certo. Por isso,
depois de algum tempo, diversos ensaios e nenhuma apresentação, a banda
terminou. Também éramos escassos de talento.
Olhando para trás, acho que nem
eu me agüentaria. Não sei como os caras me agüentaram. Nunca mais encontrei o
Nair; o vocalista, com pouco talento para cantar, mas com presença de palco e
estilo, cujo nome nem tive a condição de guardar e que era mais novo que nós,
acho que nem 18 tinha na época, só tive contato nessa época, depois nunca mais
o vi. Deve ter guardado uma péssima imagem minha; só restou minha amizade com o
Ronaldo, que volta e meia aparece depois de sumir por anos a fio.
Em 1994 saí de Santos de uma vez
por todas. Fevereiro de 1994. Nunca mais voltei a morar lá. Voltar para lá, só
de férias. Segui minha vida, o rumo que Deus guardou para mim e fui terminar a
Psicologia que havia trancado para ter meu primeiro filho, assumir uma
responsabilidade enorme de ser pai de família aos 21 anos, achando que sabia
tudo da vida. Abortei a idéia de ter uma banda, aposentei o violão, a guitarra
e guardei o sonho para uma próxima encarnação. Parei de escrever canções, ainda
arrisquei alguns versos por alguns anos, mas sem o ímpeto e a prolixidade de
outrora.
Amadureci com a dureza da vida.
Aquele sonho juvenil e adolescente de ter uma banda para impressionar as
menininhas já não cabia na minha vida. A partir dali, na minha vida, me pareceu
que “...eu não precisava provar nada pra ninguém”.
Com certeza vc não se lembra de mim, sou irmão do china que vc mencionou, estava pesquisando umas materias da legião e descobri seu blog sem querer, lembro que meu primeiro violao comprei de vc, na época andava muito com o ronaldo. Tenho contato ate hj com o nair, ronaldo, me adc ai Eduardo Yip no face.
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Excluirnão tenho face, só twitter e blog. Mantemos contato por esses meios.
Excluirbah, lembro de ti sim. Que legal cara, lembro desse meu violão, foi meu primeiro também, comprei nas casas bahia, com meu primeiro salário aos 14 anos, rsrs. Grande abraço. Como tu estás? e teu irmão? Grandes lembranças...
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